O Ilê Ashé Obá Izô (Casa do Rei do Fogo) é um terreiro de Tambor de Mina localizado no bairro da Liberdade em São Luís (Maranhão). O terreiro tem como patronos Xangô, Sogbô e Oxumaré e é dirigido por Wender Loredo Pinheiro (ou Pai Wender). Nascido em São Luís, em 1981, Pai Wender foi iniciado na Casa de Iemanjá (fundada e dirigida por Jorge Itaci de Oliveira, ou Pai Jorge) e, depois do falecimento deste, completou sua formação espiritual com Pai Euclides, pai de santo (também já falecido) da Casa Fanti-Ashanti. A sua linhagem espiritual inclui assim os dois mais importantes terreiros que, a partir dos anos 1960, marcaram a cena afro-religiosa de São Luís. O terreiro foi fundado em 2003 e agrupava, em 2014, um total de 30 filhas e filhos de santo (também conhecido/as como dançantes). Embora a maioria das filhas de santo seja de São Luís, algumas (ou alguns) residem noutros estados brasileiros, como o Pará ou o Amapá. À imagem do seu sacerdote, a maioria das filhas e filhos de santo do Ilê Ashé Obá Izô é jovem e a composição social do terreiro é algo heterogénea. A par de filhas e filhos de santo que trabalham em “casa de família” ou são balconistas, muitos outros possuem graduação e exercem profissões intelectuais.
Como muitos outros terreiros de Tambor de Mina, o Ilê Ashé Obá Izô está orientado para o culto de entidades espirituais de diversas origens: africanas, europeias ou brasileiras. Entre essas entidades espirituais avultam os voduns (divindades africanas da origem jeje), os orixás (divindades africanas de origem iorubá) e os encantados (de origem europeia ou brasileira). Os encantados correspondem a espíritos de pessoas que, após sua existência terrena, se encantaram, isto é, passaram a viver em universos paralelos ao universo humano – conhecidos como encantarias –, localizados em rios, no mar ou debaixo da terra. No Ilê Ashé Obá Izô – como na maioria das casas de culto de Tambor de Mina – os encantados incluem várias categorias de entidades espirituais (organizadas internamente em famílias): reis e nobres europeus (também conhecidos por gentis), turcos, caboclos, princesas, surrupiras.
Estas entidades espirituais organizam-se tendencialmente de modo hierárquico: os voduns e orixás situam-se no topo da hierarquia, depois vêm os nobres e princesas e por fim os caboclos. Quanto aos turcos, ocupam uma posição instável entre os nobres e os caboclos. Muitos deles têm uma origem nobre, mas optaram por renunciar a essa condição, passando a viver em aldeias indígenas, onde casaram e tiveram filhos.
Enquanto algumas destas entidades espirituais – como os orixás e os caboclos –podem ser encontrados noutras religiões afro-brasileiras, os voduns, os reis e nobres europeus, bem como os turcos, são entidades espirituais que só existem no Tambor de Mina.
Como noutras religiões afro-brasileiras, a possessão, assim como os sacrifícios animais e outras oferendas, são as principais formas de culto nos terreiros de Tambor de Mina. À semelhança de outros sacerdotes de São Luís – que em muitos casos começaram a sua carreira religiosa na cura – Pai Wender disponibiliza também os seus serviços religiosos a pessoas que o procuram para o efeito.
A possessão ocorre durante os chamados toques de tambor (ou toques de Tambor de Mina), geralmente dedicados a um grupo de entidades espirituais ou a uma entidade espiritual precisa. Estes toques têm lugar num salão dedicado ao efeito – onde se localiza geralmente o altar da casa –, podem durar horas e no seu decurso os devotos incorporam, cantando e dançando, uma pluralidade de encantados. Os toques são acompanhados por abatás e outros instrumentos de percussão – tocados pelos chamados abatazeiros – e organizam-se em torno de um conjunto de doutrinas, isto é, de cânticos dedicados às diferentes entidades cultuadas, por intermédio dos quais estas se fazem presentes na guma. O script ritual do Tambor de Mina inclui outros toques, consagrados a categorias específicas de entidades espirituais, como o Tambor da Mata – dedicado às entidades da mata – o Tambor de Índio – dedicado aos espíritos dos “índios selvagens” – e o ritual de cura – correspondente a sessões de cura em que os encantados relacionados com a pajelança se fazem presentes. Este conjunto de toques tem lugar ao longo do ano e distribui-se, no caso do Ilê Ashé Obá Izô, por um total aproximado de 18 festas, algumas das quais possuem uma ligação relevante com o catolicismo, como é o caso da festa do Divino Espírito Santo. Esta ligação com o catolicismo – geralmente designada através da expressão “sincretismo” – tem outras expressões e é um aspeto importante do Tambor de Mina. Assim, para além das analogias mais usuais estabelecidas entre entidades espirituais africanas e santos católicos (e invocações de Nossa Senhora) – cujas imagens figuram em lugar de relevo no altar da casa –, muitos toques de Tambor de Mina são geralmente precedidos por cânticos e rezas católicas e muitos terreiros, para além da festa do Divino Espírito Santo, celebram festas católicas como o Natal, a festa de Santa Bárbara – que é vista com a padroeira do Tambor de Mina – ou a festa de São Lázaro – que é homenageado por intermédio do banquete dos cachorros.