Dançantes e Abatazeiros
Entrevista com James
Dançante da Casa
Maio 2014
João Leal (JL): Eu lembro que a primeira vez que nós nos conhecemos foi em 2011 na Casa das Minas e você me falou primeiro da festa do Wender, mas assim, a sua relação com a casa de Wender é qual? É irmão de santo?
James (JA): Não, sou filho de santo dele. JL: Aí foi dos primeiros que... JA: Foi, foi, quando eu conheci, ele não tinha casa aberta, quando eu conheci ele eu fazia sessão de cura, sessão de caboclo, né? passagem de cura na minha casa em São José de Ribamar e ele saía daqui de São Luís, né? E ia pra minha casa lá dar passagem para os encantados dele, para os pajés dele de cura. A passagem era todo sábado na minha casa a tarde, eu fazia passagem de cura sem toque, só com o toque de maracá mesmo, algumas pessoas que batiam palmas, algumas pessoas que iam prestigiar, outros clientes e era assim, assim que a gente se conheceu, aí eu comecei a vim dançar na casa de Pai Jorge por intermédio dele e também de Seu Ubirajara, que me trazia pra dançar na casa de Pai Jorge, no Terreiro de Iemanjá. A gente foi se conhecendo, conhecendo, conhecendo, eu dormindo na casa dele, porque eu morava em Ribamar, eu dormia na casa dele e ia embora de manhã e assim a gente se conheceu. Aí, eu fui um dos primeiros filhos de santo dele preparado, eu senti necessidade de ser preparado no Tambor de Mina e ele já era preparado e eu não, já dançava muitos anos, mas não tinha preparo, não fui iniciado, não tinha nenhum preparo de... JL: Mas se pode dançar sem ter a iniciação completa? JA: Pode sim, eu dançava e firmava bonito, pode sim, nem todo mundo passa processo de feitoria, nem todo mundo. Tem muita gente, ainda existe gente que só lavou cabeça, só lavou cabeça, fez um remédio ali interno, não é preciso, às vezes sim, às vezes não. Agora eu, porque senti a necessidade de passar por um processo de feitoria, porque eu quis mesmo e minha senhora que é Oxum também, que pediu também que eu passasse por algum remédio mais elevado e tal, sem ser ficar só dançando tambor, dançando tambor, dançando tambor, sem ter um grau de hierarquia, de passar por algum… pra ser reconhecido também, né? Assim... JL: Então, a feitura foi só na casa de... JA: Pai Wender. JL: Aí, no início não tinha tantos filhos de santo? JA: Não, eu fui um dos primeiros, eu fui primeiro. JL: Juntamente com Eliane? JA: Não. JL: A Eliane é irmã de santo? JA: Eliane é irmã, só que ele que concluiu as obrigações dela, da Eliane, do Marcos, do Márcio. Eliane, Marcos, Aldilene, Márcio, todos são irmãos de santo dele, que ele que concluiu as obrigações deles. Agora eu não, eu fui iniciado no chão da casa dele, eu fui preparado lá, eu vou completar agora ano de santo 14 de setembro, eu vou completar, mas eu sou daquele tipo assim, que tenho minhas obrigações, minhas coisas, mas guardo muito pra mim, eu não procuro estar falando “ah! Eu vou pagar obrigação, pagar obrigação”, eu não, eu nasci só, pra quê que eu vou ter adjunto, eu não. Então, eu sou muito individual nessa parte, as minhas coisas são muito restritas, eu faço as minhas coisas ali, conforme eu aprendi, não sei coisa dos outros, só sei minhas coisas, eu não sei coisa de ninguém, pra que eu quero saber coisa dos outros? Eu não, eu só sei as minhas coisas, eu sei lhe dizer as minhas coisas, mas coisa dos outros eu não sei, quem é branco, quem é preto, quem é rico, quem é Vodum dos outros, eu sei dizer as minhas coisas, minha espiritualidade eu sei lhe explicar, até onde eu posso explicar, mais adiante eu não posso, e é assim… JL: Mas, hoje em dia também tem filhos de santo? JA: Eu tenho meus filhos... JL: Que são aquelas pessoas que estavam dançando lá [no terreiro de Wender]? JA: São aqueles meninos, meninas. Eu tenho um rapaz que dança comigo que é o Carlos, eu tenho meus filhos de santo e pretendo também, estou atrás, estou atrás, estou buscando, estou interando, estou ali com um e com outro daqui da minha casa, pra abrir o meu espaço, para abrir minha casa. JL: Mas, por enquanto, os filhos de santo dançam lá? JA: Meu pessoal dança lá na casa do Pai Wender, que é o terreiro lá da casa dele, da Casa de Xangô. JL: Todos os tambores? JA: Todos os tambores, as obrigações. Tem obrigação que só eu vou, porque é necessário que só eu vá, porque eu sou iniciado, já tenho grau, já sou o filho de santo mais velho da casa e também pelo tanto de anos que eu danço. Porque antiguidade é posto, né? Mas, tambores, quando dá pra ir todo mundo, vai, quando não dá vai a metade, mas eu tenho meu povo na minha casa, aqui não é terreiro, mas eu faço sessão lá em cima, aí no segundo andar, eu tenho as pessoas que me acompanham. JL: É cura? JA: Cura, só sessão. JL: Agora está procurando um espaço pra? JA: Fazer meu barracão, pra tocar tambor, pra fazer minhas obrigações. JL: Aqui no centro [de São Luís]? JA: Aonde chegar eu vou, só não quero dentro de favela, com certeza, eu não quero, mas eu estou procurando um espaço pra comprar um terreno, aqui no centro acho que não vai dar porque tem toque e nem todo toque pode fazer de tarde. JL: É, tem esse problema. JA: Pessoal trabalha, faz faculdade, faz seus bicos e eu não quero está ocupando a vida de ninguém, quero fazer num dia que todo mundo possa ir, pois é, mas é isso. JL: E fora do centro também tem mais espaço… JA: Isso, pois é, mas eu não quero ir pra muito longe. JL: É, pra muito longe também [não dá]... JA: Por que meu encantado aqui, ele que determina, ele que dá ordem aqui em casa, tudo é ordenado por ele, né? Minha Mãe Oxum é que é dona da minha cabeça, que determina tudo e ele que é o mensageiro dela pra dizer o que é, o que não é, qual é a cor, o que vai se comer, o que vai se comprar, porquê isso, porquê aquilo, tudo é ele que determina. JL: Tu tem Oxum? JA: Minha senhora… JL: E Ubirajara? JA: Não, Seu Ubirajara é meu encantado, meu chefe de Guma, ele que é o mensageiro dela, que fala, que determina, que no caso é uma espécie como se fosse esse Oxum da Umbanda, que o pessoal recebe, que é o mensageiro, ele é que dá os recados aqui. JL: E que mais encantados é que recebe? JA: Não, só isso. JL: Tem outro gentil? JA: Tem, mas eu não falo assim, porque eles não estão todo dia, nem toda hora, é lá alguma vez ou outra. JL: Porque o gentil vem tão pouco? JA: Determinação deles mesmos, porque eles querem, pois é. Agora meu tudo aqui é Seu Ubirajara, ele é que manda aqui, que determina, que chefia as coisas aqui… Agora tem os outros encantados que passeiam, mas eu não gosto muito de falar porque eles não determinam nada aqui, eles não mandam em nada, aqui quem manda é Oxum e meu Pai Xapanã, né? E meu Pai Xangô também, mas aí, depois deles, quem manda aqui é Seu Ubirajara, não tem outro caboclo, “ah! Porque eu recebo caboclo fulano, caboclo sicrano, caboclo”. Não, eles passam na minha corrente, então, eu não posso afirmar que eles são da minha corrente, mas não estão todo dia, nem toda hora, Seu Ubirajara também não está todo dia, nem toda hora, mas ele que é chefe daqui, ele é que determina, ele é que durante essa vida toda que me segura, que me sustenta, que me dá tudo, se eu tenho tudo que o senhor está vendo aqui é dado por ele, né? JL: Caiu no santo com que idade? JA: Com 8 anos. JL: É? JA: É, com 8 anos de idade, na Maioba, lá numa festa de São Lázaro, né? Festa da obra de meu Pai Acóssi, na casa da senhora chamada Zuleide, lá na Maioba, eu segurando lá um cachorro na mesa, dia de São Lázaro, virei, caí lá com meu senhor, me atuei, de lá em diante, aí eu estou hoje aqui. Então, é uma festa, uma obrigação que eu não posso deixar de fazer, é a festa do meu senhor, meu senhor que é Xapanã, eu não posso deixar de fazer, que é 20 de janeiro. JL: 20 de janeiro? JA: É, 20 de janeiro, o dia do santo, sincretismo do meu senhor, é 20 de janeiro, dia de São Sebastião. JL: Mais aí, começou a curar com que idade? JA: Com 8 anos mesmo. JL: Foi? JA: Comecei procurar, fui dançando aqui, fui dançando acolá, era sacoleiro, eu dançava aqui, dançava acolá, ia pra casa de um, ia pra casa de outro, eu não tinha paradeiro certo, agora não, a gente vai amadurecendo. JL: O terreiro de Iemanjá foi o primeiro terreiro onde dançou? JA: Não, eu já dançava por aí tudinho. JL: Mais foi o primeiro que começou a dançar assim mais tempo, é isso? JA: Não, eu dançava em tudo quanto é lugar, eu não tinha mais tempo de dançar aqui, dançar acolá não, assim, “ah! Dançou tantos anos ali”, não, eu dançava aqui, eu dançava ali, eu dançava em tudo que era terreiro, eu ia para o interior dançar tambor, fui em Icatú, Baiací, Primeira Cruz, Humberto de Campos, Tatuába, Sabugado, eu ia tudinho, mas agora, cortei, não dá mais. JL: Mas, continua indo nos toques de tambor na casa de Pai Euclides, né? JA: Continuo, lá é a única casa que eu arrumo sacola pra dançar, mas [não] na casa de ninguém. JL: Não? JA: Não, só lá na casa de Remédios, que é irmã de santo do Pai Wender, que já vem ser minha tia, que recebe lá meu gentil, que é Toy Zezinho, ela recebe, acho que é por isso que tenho uma ligação, eu gosto de ir pra casa deles, eu gosto, eu não vou em todos os toques lá, mas eu danço as vezes por Sant’Ana, eu danço agora pela festa de São Miguel, que é o tambor de Borá de lá, eu não danço Borá, eu só danço Mina. Aí tem as três noites de Borá e duas de Mina, aí eu tiro uma dessas, ou eu vou na primeira logo, que é de Mina, toca a primeira, a segunda e terceira, são três noites de Borá, aí tem duas de Tambor de Mina pra completar as cinco noites, aí eu danço na quarta ou eu danço na quinta, mas às vezes eu vou mais na quarta dançar, eu não gosto de fechar tambor de casa alheia, né? Que cada um tem seus segredos, suas coisas, suas penitências, né? Aí eu não gosto muito. Da Casa de Mariano, que eu fui dançar esse ano pela festa de Senhor (Ossani), que é filho de santo de Pai Euclides, que já vem ser meu tio de santo, assim, mas pra mim arrumar sacola mesmo, só na Casa de Fanti, lá, por que lá eu aprendo as coisas, lá é meu espelho, lá é que eu aprendo, que eu vivo nesse comportamento até hoje que eu tenho, pela Casa de Fanti, mais em outro terreiro eu não vou aprender nada, vou aprender o quê? JL: Mas não fez lá nenhuma obrigação, feitura? JA: Não, não. Eu sempre dancei lá, sempre dancei, já tem 17 anos que eu danço na Casa de Seu Euclides, que eu vou, às vezes eu danço em agosto, as vezes eu danço em setembro, as vezes eu danço em junho. JL: E vai em todos os tambores? JA: Não, é só algumas festas, mas Seu Ubirajara lá é muito bem vindo, tanto que ele é padrinho do Boi de Seu Corre Beirada, né? Na Turquia eu não danço, mas Seu Ubirajara vai, por que é a casa do pai dele, o Rei da Turquia, né? Aí ele vai e minhas filhas dançam lá na Turquia e ele vai em mim, ele fica lá, ele vem embora de manhã, ele fica por lá brincando, também não dança, mas canta também, eu chego a cantar também, Seu Euclides pede pra mim, canta aí, na hora que chega a minha, que ele acha que é determinado mandar eu cantar, né? Pela ordem dele lá, aí eu canto alguma coisa que eu sei. |
«O encantado dele chamado Senhor Dom Luís, que é o dono da festa, entregou a festa na minha mão. A festa começou com uma salva, a salva de Divino Espírito Santo e São Luís Rei de França, né? São Luís, porque o encantado é Dom Luís e o santo é São Luís, que é o santo católico. Então, ele entregou na minha mão...»
JL: Mas, dançantes homens não dançam?
JA: Lá na Turquia não dança não. JL: Não dança né? JA: Não, lá não, mas os homens se atuam lá, e Pai Euclides também, Seu (Jaguareguara)... JL: É, mas eu fui lá uma noite esse ano e estavam lá duas dançantes. JA: Minhas? JL: Isso. JA: Isso, pois é, minhas filhas que já dançam, Ana Lúcia e Regina, elas dançam lá, minhas filhas. JL: Na festa do Divino, quem está mais presente não é tanto o Pai Wender, mas o senhor, né? JA: Mas é porque o encantado dele chamado Senhor Dom Luís, que é o dono da festa, entregou a festa na minha mão. A festa começou com uma salva, a salva de Divino Espírito Santo e São Luís Rei de França, né? São Luís, porque o encantado é Dom Luís e o santo é São Luís, que é o santo católico. Então, ele entregou na minha mão, quando começou, a gente se sentou nós dois e a gente disse, ele disse, “ah! vambora levantar o mastro”. JL: Mas isso foi logo no primeiro ano que Dom Luís entregou a festa pra [Wender]... JA: Foi, foi no primeiro, sempre eu estive de frente, sempre eu estive, tanto na salva, tanto na salva como na festa e a gente combinou, né? De um ficar pro lado daqui, eu cuidava, ele cuidava de outro, ele angariava as coisas por lá, eu angariava por aqui com meu povo, pra poder fazer o festejo de Divino Espírito Santo e São Luís Rei de França. Aí era salva, depois da salva a gente combinou de fazer assim, vambora fazer, vambora, vambora, vambora, “ah! Tu fica para o lado de lá com Seu Ubirajara, eu fico para o lado daqui com Seu Cravinho pra conseguir as coisas” e está até hoje. Então, Seu Dom Luís entregou a festa na minha mão, a casa é dele, né? Do Pai Wender, a casa é dele, a festa é dele, é no nome dele que é registrada, mas quem toma conta da parte da essência, da essência da Festa do Divino, da religião, de tudo da festa sou eu, né? Os rituais é eu que tomo conta, eu que determino, eu que digo o que é, eu só não me meto no partimento de bolo dos outros, que quiser partir seus bolos que parta, quem quiser dar pra quem quiser dar que dê, mas a parte litúrgica da festa do Divino Espírito Santo quem comanda sou eu, horário de missa, o que eu canto, o que eu rezo, a hora de tudo, de levar pra mesa os Impérios pra almoçar, pra jantar, pro chocolate, pra levar para o pé do mastro, pra tocar alvorada, a hora de buscar o roubo, onde é que bota o roubo, eu não quero longe, eu quero é perto, que não dá mais pra está andando assim, não dá mais. Então assim, ele entregou pra mim, eu que fico na frente, pra resolver as coisas, é ele que é o dono da casa, mas o encantado dono da festa entregou pra mim, porque ele viu que eu tinha capacidade, competência de dominar um festejo. JL: Pro senhor e para Ubirajara? JA: Não, mas Seu Ubirajara, ele não entregou pra ele não, Seu Ubirajara que vem e também toma conta, porque ele sabe que eu que estou tomando conta, então ele vem e toma conta também. JL: Mas antes não tinha a experiência de Festa do Divino? JA: Sempre tive, eu sempre tive, por que eu morava em São José de Ribamar e por onde eu passava tinha festa, tinha festa na Casa de Nhô Zico, Santana do Divino Espírito Santo, eu tocava caixa [do Divino Espírito Santo] no Tatuaba com Marcelina, é, Marcelina tocava caixa no Tatuaba. JL: Começou tocando caixa com que idade? JA: Com 9 anos, 10 anos, lá pelo Ribamar, mesmo meu pai e minha mãe brigando, mas eu ia tocar caixa no Tatuaba... JL: Tinha preconceito contra homem tocando caixa? JA: É, tocando caixa e tudo, mas eu ia, tirava jóia, cantava na porta pra ir buscar coroa, por isso que eu sei tudinho. Na hora que vai buscar roubo, cantar pro o roubo, pra pegar aquelas coisas na casa da pessoa, aí no dia que vai buscar a santa Croa, cantar Espírito Santo dobrado na porta pra receber a santa Croa, cantar lá dentro pra santa Coroa, tudo isso eu fui pegando, um pouquinho de cada coisa, por isso que eu sei. JL: Você pode dizer que é devoto do Divino? JA: Eu sou devoto do Divino Espírito Santo, sou, sou devoto do Divino Espírito Santo até quando eu morrer, sou devoto por que eu alcanço graça, eu fiz até um verso, “ meu Divino Espírito Santo, santo que eu tenho confiança, por que já recebo graça desde o tempo de criança”. Eu recebo graça desde o tempo de criança e esse verso quem fez foi eu, “meu Divino Espírito Santo, santo que eu tenho confiança, por que já recebo graça desde o tempo de criança”. JL: Mas caixeiras e caixeiros… tem uma parte daquilo que cantam que é da tradição, tem parte que não pode ser improvisado, né? JA: Da tradição, mas tem coisas, tem verso que é criado pela [gente], que o Espírito Santo bota na cabeça da gente, é o dom, é o dom da criação dos versos, de compor aquele verso. Pois é, como eu estou lhe dizendo, que esse aí foi eu que, veio na minha cabeça, eu tocando caixa, né? que o pombinho branco me botou e eu sou devoto do Divino Espírito Santo, sou devoto porque eu recebo mesmo graça, as coisas acontecem, as coisas chegam, né? E é assim. JL: A primeira festa que organizou foi lá na casa do Pai Wender?... JA: Na casa do Pai Wender. JL: Então, muita coisa ainda não tinha experiência, era só de ver? JA: Só de ver, mas só de ver eu consigo organizar, eu sei se o comer vai dar, se o comer não vai dar, o que é aquela salada, aquela verdura, que horas que bota no fogo. É assim, assim, assim, é assim. Como enfeita a bandeira, como é que faz a tribuna, que cor de flor que combina, é tudo. JL: É muita responsabilidade… JA: Porque você, além de tomar conta de uma festa de Divino Espírito Santo, você tem que ter amizades, eu conheço gente do Convento das Mercês que libera a banda, eu conheço gente de igreja que… A missa da festa do Divino Espírito Santo da Casa do Pai Wender é especial, porque é de uma igreja, um horário que não tem missa na comunidade. Porquê que tem? Porque James conhece o secretário, o padre, aí eu vou, eu peço tudinho, então acontece… JL: Qual é a parte mais difícil da festa? A parte que dá mais dor de cabeça, mais trabalho, mais preocupação? JA: Confeccionar a tribuna. JL: É? JA: É, e a comida, a parte da comida, preocupa porque tem muita gente, então a gente fica com medo da comida não dar. E a confecção da tribuna, que sai caro, flores, rendas, grampos, bordados, tecidos. JL: Uma tribuna pode custar quanto? JA: Três, quatro mil reais, aí é preocupante, porque você não tem patrocinador, você não tem ninguém empresário, ninguém tem aquelas condições pra pegar três mil, quatro mil, dois e quinhentos pra botar na mão e comprar tudo isso, mas todo ano acontece, eu me viro de um lado, me viro do outro, ele se vira do lado, se vira do outro e a coisa acontece. JL: Esse ano não teve esses apoios da [Secretaria Estadual da] Cultura. Acha que esse dinheiro faz falta? JA: Faz, porque ajuda ao menos comprar um porco (risos), [mas] não dá pra fazer a festa nunca. JL: Acha que vai acabar esses apoios? JA: Se acabar, nós não vamos passar por baque, porque todos os anos a gente mete a mão no bolso, sai do bolso do Pai Wender, sai do meu bolso, sai do bolso de algumas pessoas da casa também que contribuem, não é só eu e ele, ele e eu. Não, algumas pessoas contribuem também, tem alguns filhos de santo da casa que contribuem pra aquela festa, uns contribuem com mais, outros contribuem com menos, outros ajudam braçalmente, outros ajudam a fazer a comida, outros fazem tribuna, outros varrem, outros enxugam o chão, né? Todo mundo ajuda, de qualquer forma ajuda. JL: Se pode dizer que a Festa do Divino é assim a festa mais destacada, maior? JA: Maior, destacada é a festa do Divino Espírito Santo. JL: É aquela que traz mais gente de fora, é? JA: É, de fora. JL: Traz muitos pais de santo? JA: É, e lá no terreiro já tem outra festa também, que traz muita gente também de fora, é a Festa de São Sebastião, que é 19, 20 e 21 de janeiro, essa festa é uma festa grande, né? Tem almoço, janta, café da manhã... Missa, procissão… É uma festa grande, é a Festa de São Sebastião, onde a gente homenageia Seu Nego Xapaná, Obaluaiê, Pai Acóssi. [Tem] o banquete dos cachorros, a mesa dos inocentes… JL: Se pode dizer que Ubirajara também é devoto do Divino? JA: Não, ele não é devoto, ele só faz o papel que eu podia estar fazendo, mas ele não é devoto, não é não, eu é que sou devoto do Divino Espírito Santo. JL: Outro dia estava dizendo que se não ajudasse na festa, Ubirajara vinha, cobrava. JA: Pois é, mas é por que ele tem uma responsabilidade dentro da festa, ele tem uma responsabilidade, ele assume, o Seu Ubirajara não é encantado de pular fora, ele é mesmo e pronto, o que der pra ele, dá e pronto, ele não está nem aí, ele faz a coisa acontecer, ele não é de dizer não, por isso é que ele se faz presente, ele toma conta, ele dá conta de tudo, abaixo de Deus e Nossa Senhora ele está lá conduzindo, né? Agora com isso, se as pessoas, filhos da casa. não dão credibilidade nesse momento, de rezar uma ladainha na hora que está encerrando pra fechar a tribuna, não vai aprender nunca, nada, não vai aprender, por que aquele momento é o momento de está ali pra aprender… JL: Aprendeu a ladainha com quem? JA: Em Ribamar, com Dona Dolores, ela já até faleceu há muitos anos. JL: Quando era também pequeno? JA: Era pequeno, eu já rezava, porque eu sempre fiz a festa de São Sebastião, porque meu senhor adora São Sebastião, eu sempre fiz lá no Ribamar, não é aqui que eu vim começar a fazer não, eu já fazia do Ribamar. JL: Então, vamos dizer que o senhor é religioso de várias maneiras? JA: Várias maneiras... JL: Católico? JA: Católico e também de Tambor de Mina, de religião de matriz africana, eu sempre conciliei uma coisa com a outra, eu assisto missa, eu canto procissão, eu canto ladainha, tudinho… Eu aprendi com Dona Dolores, ela me passou um caderno e cantava pra mim, eu ia escutando, toda ladainha que ela ia rezar eu acompanhava ela, eu aprendi, agora eu rezo sem caderno, eu já sei. JL: Esse caderno foi escrito... JA: Por ela. Velho como quê aquele caderno, antigo, está até largando as folhas, foi ela que escreveu pra mim… Bendito de São Sebastião, hino de São Sebastião, São Benedito, Santa Bárbara, Santo Antônio, São Pedro, nossa! Santa Maria, Nossa Senhora de Conceição, todos, mês de maio, tudo, tudo, tudo, Santa Luzia, tudo. JL: Curador, Pai de Santo, reza ladainha, organiza Festa do Divino, caixeiro, católico. JA: Pois é, uma porção de coisa, né? |