Dançantes e Abatazeiros
Entrevista com Dona Antônia
Dançante da Casa
Maio 2014
Antônia (AN): Meu nome é Antônia […]. Sou nascida e criada aqui em São Luís. Meu pai era de Teresina, minha mãe era daqui mesmo. Estou com 48 anos, vou fazer 49. Minha profissão é doméstica e tenho 2 filhos e 2 netos. Estudei até a 5ª série.
João Leal (JL): Como é que caiu no santo? AN: A minha mãe, ela já nasceu de berço, né? Como o pessoal diz, já era de berço, eu não, eu já vim depois, Depois que ela faleceu, foi que apareceu, foi que eu fui sentir coisas. Pra mim chegar até aqui, foi dia 20 de janeiro, dia de São Sebastião, a procissão passou e a Tassiane já tinha-me convidado pra mim vim pra cá, conhecer a casa: “Ah! tá Tassiane, eu vou”. Aí, quando a procissão passou, [tava] uma chuva grossa, eu acompanhei a procissão, vim, teve tambor, olhei o tambor, mas me sentindo mal, aí me sentindo mal. JL: Isso foi em que ano? AN: Foi em 2011. Aí eu fui, fiquei olhando, teve a procissão, depois da procissão teve tambor, aí eu comecei a me sentir mal, não me pergunte como foi, na época, porque eu não sei mais lhe dizer nada, fiquei sem chão, fiquei sem perna, sem reação de mais nada, aí eu não sei lhe dizer… JL: E foi aí que tudo começou? AN: Foi daí que tudo começou, porque eu já era de outra casa, né? Mas nunca tinha sentido o que eu senti aqui. Eu já tinha passado por outra casa, só que era diferente, a casa de lá. E aí foi que eu vim pra cá, foi a primeira vez que eu senti aqui na casa, né? Que eu senti o meu senhor, que foi Oxóssi. Aí de lá pra cá eu tenho meu senhor e tenho a minha senhora, que é Iemanjá, aí tenho meu caboclo que é Seu João Pretinho. JL: E esse caboclo, como é que ele é? AN: Eu sinto ele diferente, cada um sente de um jeito, né? Eu sinto diferente, vai assim me criando assim um calor, eu vou suando, vou ficando sem o chão, cada um sente de um jeito, cada um não sente igual. JL: Ele é como: sério, brincalhão? AN: Não, é sério, não é muito brincalhão não. JL: E princesa, tem? AN: Não, princesa eu ainda não tenho ainda não, assim de frente não, tenho só ele, que é o primeiro, ela é a segunda e tenho o caboclo, só. Agora, o senhor está falando assim de menina? De criança? De criança eu só tenho Dona Maria Antônia, que vem na linha de criança, a 27 de Setembro, no dia de São Cosme e Damião. JL: E assim, a sua família, vizinhos, aceitam bem? AN: Sim, minha avó também tinha, meu pai não era contra, minha mãe era também. JL: Qual é a doutrina que gosta mais? AN: A que eu gosto mais é de Seu João Pretinho. “Eu sou Pretinho, eu sou preto mesmo, eu sou Pretinho, eu sou preto mesmo, só ando montado em cavalos alheios, só ando montado em cavalos alheios” (cantando). JL: Aqui na casa, a senhora ainda não foi iniciada, né? AN: Não, só tenho uma lavagem de cabeça na casa, eu não sou iniciada ainda não. [Pra ser iniciada] tem que ser apontado pelo dono da casa, pelo vodum, o dono da casa, no caso, pelo dono da casa, que é meu pai Xangô, tem que ser apontado por ele. JL: Qual é a diferença: a senhora também dança na guma… AN: Tem diferença sim, o senhor fez perguntas pra elas que se o senhor fizer pra mim, eu não sei responder. Ali na guma quem é iniciada é mais acima, né? JL: Como é que é dançar com o encantado? AN: Eu me sinto leve, porque enquanto ele não vem a gente tá pesada, depois que eles estão em cima da matéria, a gente se sente leve, porque eles estão querendo é a matéria, algo pra se usar, então, depois que usa a matéria, a gente se sente leve. |
«Mas nunca tinha sentido o que eu senti aqui. Eu já tinha passado por outra casa, só que era diferente, a casa de lá. E aí foi que eu vim pra cá, foi a primeira vez que eu senti aqui na casa, né?»
JL: E não cansa?
AN: Não. JL: Se, por exemplo, tiver dançando uma noite, depois no final, não sente cansaço quando o encantado vai? AN: Eu não me sinto cansada não, mesmo eu não trabalhando mais, só em casa, mas eu não me sinto cansada. JL: Fora aqui do terreiro, de vez em quando baixa o seu caboclo na senhora? AN: Não, a não ser na minha casa. Mas não é baixar, muita das vezes a gente sente a presença dele, não é obrigado ele baixar na gente, ele vem e fez uma visita rápida, que eu moro só eu e meu filho, faz alguma coisa que deve fazer e vai embora e não tem quem diga, muita das vezes acontece. Mas não é com todo mundo. JL: A senhora se lembra quando o caboclo baixa? Se lembra do que que se passou quando ele está na sua cabeça? AN: Não. Sabe porquê? Sempre tem que ter alguém do lado pra deixar a mensagem, porque se não tiver, não tem como ele deixar a mensagem, então, se você não tiver outra pessoa pra deixar a mensagem, vai ficar por isso mesmo, a não ser que deixe alguma coisa lá, aí sim, deixou alguma coisa, pegou alguma coisa, botou ali, acendeu uma vela, fez alguma coisa, aí quando a gente voltar em si, “ah! fulano veio aqui”. A não ser isso, não tem como deixar mensagem. JL: Depois não lembra? AN: Não, não dá pra lembrar, a não ser que tenha a pessoa do lado. JL: A senhora já bancou os Impérios? AN: Não, porque não tenho filho pra isso, meus filhos já estão todos grandes. JL: Há pessoas que, por exemplo, não têm filhos, mas bancam os Impérios com uma criança que é um vizinho, um sobrinho. AN: Não, não, não, nunca banquei. JL: A senhora é católica? AN: Com certeza, católica e romana, sou católica, apostólica e romana. JL: Faz de vez em quando promessa pra santo? AN: Ah! Faço, eu faço de vez em quando. JL: Tem algum santo de devoção? AN: Só São Sebastião [e] Santo Antônio. JL: As pessoas dizem “ah! o terreiro é uma família”, verdade? AN: É, é uma família, mas muita das vezes a hora que a gente mais precisa não tem. É uma família dentro do axé, mas é muito diferente fora do axé, dentro a gente é uma família, por que está todo mundo junto, agora fora do axé é cada um por si. JL: E o seu pai de santo? AN: Ah! Eu adoro, não tenho o que dizer dele. Se precisar ele está aqui sempre pra servir. JL: A sua vida mudou quando passou a vir aqui? AN: Mudou, mudou sim, mudou, mudou, mudou muito. Mudou, mudou, só está faltando, o que está faltando pra mim é só eu ter minha casa, o resto eu tiro de letra. Quem trabalha de doméstica sempre tem suas idas e vindas, trabalha numa casa sim, em outra não. Agora, depois que eu parei de trabalhar, eu não tenho muito o que dizer, entendeu? Fora isso… |